Páginas

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Acabe foi às compras. O dom de curar de Jezabel

Engraçado, que Acabe quase se arruinou emocionalmente por não ter conseguido fechar negócio com Nabote, a ponto de se isolar em seus aposentos reais e se afogar em suas lágrimas como um grande fracassado, mas o estranho é que ele não teve a mesma reação, logo de início, quando o sírio Ben-Hadade, rei da nação que despontava como séria inimiga de Israel, bateu o pé, mandando recado que logo se apossaria de todos os seus pertences (1 Rs 20.3). A Bíblia de estudo aplicação pessoal em sua nota de rodapé (1 Rs 20.1ss), comprova o perigo que rondava Israel na época. 

“Três principais inimigos ameaçaram Israel e Judá durante os dois séculos seguintes – Síria, Assíria e Babilônia. A Síria, a primeira nação a subir ao poder, representava uma ameaça imediata para Acabe e Israel”. BAP (p. 494).

Passado este perigo Acabe (1 Rs 20.19), respirou aliviado, pois poderia direcionar suas preocupações com o seu reinado e principalmente, com os seus súditos, e porque não dizer com os pertences daqueles que se mostravam fiéis a ele.

Afinal, que vitória majestosa, com a ajuda de Deus. Venceu aquele que desejava se apossar de sua nação, de seu povo, de suas propriedades, de sua família, de tudo o que possuía. E olha que tinha muito por ser tomado. Palácio em Samaria, casa de verão em Jezreel, uma mulher dita “maravilhosa, estrondosa, linda e agradável aos seus olhos” (cf Jz 14.3, p. final). Ela foi bem descrita por Josefo:

“Jamais mulher alguma foi mais ousada e insolente. Tão horrível era a sua impiedade que ela não se envergonhou de edificar um templo a Baal, deus dos tírios, de plantar madeiras de todas as espécies e de estabelecer falsos profetas para prestar um culto sacrílego a essa falsa divindade. Como Acabe sobrepujava a todos os seus predecessores em maldade, ele tinha prazer em manter sempre essa espécie de gente junto de si”. JOSEFO (livro oitavo, capítulo 7).

Então o que poderia ser feito daquele momento em diante? Percorrer seu reinado e agradar seus olhos com a riqueza e prosperidade de todos. Que alegria em ver seus súditos felizes e agradecidos pela vitória. Acabe pensou: “Espere um pouco, preciso aliviar a tensão dos últimos dias? Toda a angustia que senti, ante a invasão iminente, preciso desabafar, conversar com alguém, vou às compras!

Mas tal como um gato preguiçoso, ele não conseguiu ir muito longe, andou apenas alguns metros (1 Rs 20.1) e deu de cara com aquilo que seria capaz de alegrar o coração. A propriedade de um pobre trabalhador, zeloso pela Lei e fiel súdito.

O que parecia alegria, de inicio, tirou-lhe a calma e quase separou sua carne da alma (cf Hb 4.12), mas esta ameaça ficou somente no quase, pois esta divisão é atribuição exclusiva da Palavra de Deus. A alegria primeira se transformou em princípio de depressão. Ele tentou de todas as formas fechar aquele negócio, ofereceu dinheiro, quem sabe muito. Ofereceu prestígio, pois estava ele mesmo negociando, sem a presença de corretor ou atravessador e por fim ofereceu a possibilidade de crescimento material, prosperidade, já que propôs a troca por outra vinha maior e melhor. Josefo descreveu como se deu esta negociação e porque houve a recusa:

“Um homem da cidade de jezreel, chamado Nabote, possuía uma vinha que confinava com as terras do rei Acabe. Várias vezes o soberano rogou-lhe que a vendesse ao preço que quisesse ou a trocasse por qualquer outra, porque tinha dela necessidade, para aumentar o seu parque. Nabote, porém, jamais se decidiu a isso, dizendo que nenhuma outra uva lhe poderia ser mais agradável que a produzida por uma vinha deixada pelo pai”. JOSEFO (livro oitavo, capítulo 7).

Aquela recusa doeu em Acabe, muito mais que as ameaças de Ben-Hadade, rei sírio. Saiu correndo, chorando, se trancou em seu quarto, como um mimado menino diante de um não. Seu choro despertou sua rainha, que logicamente lhe trouxe palavras de consolo, na tentativa de animá-lo ou quem sabe lhe aconselhou a procurar outros terrenos, outras propriedades maiores e mais rentáveis do que aquela que estava ao lado deles. Antes ela tivesse se portado desta forma, mas o que fez mudou completamente o rumo daquele história. Josefo descreveu o estado emocional do rei, as artimanhas da maldosa rainha e o trágico fim de uma família de fiéis súditos:

“Essa recusa ofendeu de tal modo a Acabe que ele não quis mais comer nem tomar banho. Jezabel perguntou-lhe a causa daquilo, e ele contou que Nabote, por uma estranha grosseria, lhe recusara obstinadamente vender ou trocar a sua vinha, embora ele se tivesse humilhado e lhe rogado em termos indignos da majestade de um rei. A altiva princesa respondeu que aquilo não era motivo pelo qual se devesse afligir, a ponto de esquecer até o cuidado com a própria pessoa, e que se tranquilizasse e confiasse nela, sem se preocupar mais: ela tomaria providências, e a insolência de Nabote seria castigada. Imediatamente mandou escrever em nome do rei aos principais oficiais da província, para que decretassem um jejum, e, quando o povo estivesse reunido, dessem o primeiro lugar a Nabote, pela nobreza de sua descendência, mas em seguida fizessem ele ser acusado por três homens, que o rei lhes mandaria, de ter blasfemado contra Deus e contra o rei. Desse modo, ele seria então eliminado. Tudo foi executado, e Nabote foi apedrejado e morto pelo povo. JOSEFO (livro oitavo, capítulo 7).

Mas Acabe teve uma companheira fiel, alguém como quem pode desabafar, aliás, que fez de tudo para compreender e resolver o problema do marido, até mesmo se inteirar de um assunto que desconhecia, por ideais e por não suportar, pois teve que procurar na Lei alguma brecha pela qual poderia acusar o pobre Nabote.

Jezabel conseguiu dar uma roupagem espiritual para o seu plano, pois como Nabote houvera invocado seus direitos assegurados na Lei (Lv 24.13-16), ela, portanto, decretou que pela mesma fonte ele deveria ser morto. Convocou as testemunhas, conforme previsto por Moisés (Dt 17.6-7), porém mentirosas, bem diferente do pedido e formalizou a acusação. Nabote e sua família foram apedrejados e mortos injustamente.

Que plano digno de aplausos, mas o que esperar desta mulher, que somente fez uso da Lei para roubar, matar, destruir e justificar os seus erros. Esta foi a maneira que ela encontrou para “curar” o início de depressão de Acabe. Que fascinante este “dom de curar” que ela possuía! Ela chegou em sua residência de verão em Jezreel e gritou bem alto: “RECEBA, tome posse da benção, Acabe, e não se preocupe, pois o fim justifica os meios! Conforme escrito por Josefo:

“Jezabel de imediato mandou dizer ao rei que ele poderia tomar posse da vinha de Nabote quando quisesse, sem que isso lhe custasse coisa alguma. Ele ficou tão contente que se levantou da cama e para lá se dirigiu no mesmo instante. Deus, porém, cheio de cólera, mandou Elias perguntar-lhe por que havia feito morrer o possuidor legítimo daquela propriedade, pois dela se havia apoderado injustamente”. JOSEFO (livro oitavo, capítulo 7).

Que alegria poder passear pelos seus campos e contemplar aquela vinha condenada a virar uma horta. Que alegria por ver que sua autoridade e riqueza ainda falavam mais alto. Que alegria, que alegria, que alegria, até que contemplou o Tisbita, o perturbador de Israel (1 Rs 18.17).

Na integra o diálogo dos dois:
- O que eu fiz agora? Me tens por inimigo? Disse Acabe.
- Sim, tenho por inimigo, porque se vendeste para fazer o que é mau aos olhos do Senhor. Disse Elias.
- Mas eu não fiz nada, foi ela, foi esta mulher que Deus me deu (cf Gn 3.12). Retrucou Acabe.
- Mulher que Deus te deste? Toma vergonha Acabe, esta desculpa não cola mais. Deus não te deu mulher nenhuma, lembra que foi você que foi buscá-la em Sidom? Finalizou Elias.

Acabe aceitou a repreensão e se arrependeu (1 Rs 21.27) e Deus retardou por um breve momento a sentença (1 Rs 21.29), mas Jezabel, tal como no desfecho do  ocorrido no Monte Carmelo, não deu importância e continuou acreditando nos seus inúmeros deuses, obras das mãos de homens, até que se cumpriu a palavra dita por Elias, sobre a sua morte (1 Rs 21.23, cf 2 Rs 9;30-33). Sobre isto Josefo escreveu:

“Quando Acabe soube que Elias vinha ter com ele, suspeitando do que o profeta pretendia fazer, confessou, para evitar a vergonha da censura, que usurpara a propriedade, mas que nada tinha a ver com o sucedido. Respondeu-lhe o profeta: "O vosso sangue e o de vossa mulher serão derramados no mesmo lugar onde fizestes correr o de Nabote e onde destes o seu corpo para pasto dos cães, e toda a vossa descendência será exterminada, como castigo por um outro grande crime, isto é, o de violar a lei de Deus, fazendo morrer um cidadão contra toda espécie de justiça". Tais palavras fizeram tal impressão no Espírito de Acabe que ele confessou o seu pecado. Revestiu-se de um saco e saiu descalço, não desejando nem mesmo comer, a fim de expiar a sua falta. Deus, comovido pelo seu arrependimento, mandou Elias dizer-lhe que, como ele estava arrependido de tão grande crime, adiava o castigo para depois de sua morte, mas que o seu filho seria castigado”. JOSEFO (livro oitavo, capítulo 7).

Referências:
Bíblia de estudo aplicação pessoal. CPAD, 2003

Bíblia Sagrada: Nova tradução na linguagem de hoje. Barueri (SP). Sociedade Bíblica do Brasil, 2000

Bíblia Sagrada – Harpa Cristã. Baureri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembleias de Deus, 2003

JOSEFO, Flávio. História dos Hebreus. De Abraão a queda de Jerusalém. 8ª Ed. Traduzido por Vicente Pedroso. Rio de Janeiro. CPAD, 2004

Por: Ailton da Silva - Ano IV

Um comentário:

  1. Que Deus continue te abençoando! E te inspirando ao escrever esses textos. Amém!

    ResponderExcluir