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sexta-feira, 17 de setembro de 2021

Prefiro murmurar no deserto. As dez murmurações do primogênito. Capítulo 2

A MURMURAÇÃO

Os hebreus partiram em direção à Terra Prometida, cada vez mais confiante nas intervenções de Deus. A certeza era que sempre seriam socorridos, quando estivessem com problemas, nada mais justo, para um povo, que até então, não havia levantado um dedo sequer para se defender ou para mudar o caos.

Muita confiança e pouca demonstração de conversão. Era esta a situação espiritual dos hebreus. Seria inadmissível imaginarem que o tão sonhado território seria avistado e pisado logo aos primeiros dias da caminhada. Até poderia ter sido, caso Deus tivesse permitido que repetissem o caminho feito por José, quando da sua ida como escravo ao Egito. Seriam poucos dias, mas por outro lado estariam vulneráveis aos ataques dos avançados, temidos e bem aparelhados filisteus. O caminho mais curto seria também o mais perigoso.

Israel ainda não estava preparado para enfrentar um inimigo deste porte. Seria melhor dar a volta e enfrentar opositores não tão poderosos, assim ganhariam experiência, que seria útil, quando adentrasse Canaã, já que ali a luta seria ferrenha.

Para quem havia visto a maior potência da época sucumbir diante de seus olhos, que fim imaginavam para estas pequenas nações que se atreveram a barrar a caminhada em direção à Terra Prometida.

Já refeitos do grande susto, após o desfecho no Mar Vermelho, os hebreus seguiram viagem em direção ao deserto de Sur, lugar hostil, onde avistavam somente pedras e areia.

Andaram por três dias e não encontraram água. Outro grave problema a vista, mas estavam tão confiantes nas providências de Deus que se imaginaram vencendo toda e qualquer dificuldade. A qualquer momento o extraordinário aconteceria em favor deles, seria questão de tempo, no entanto, pela primeira vez foram vencidos por um pequeno detalhe, insignificante e de grandes proporções, ao mesmo tempo, algo de vital importância para a sobrevivência naquele deserto, a falta água doce.

Um alívio parece ter assaltado o coração deles quando avistaram águas, mas a decepção veio na mesma velocidade da alegria. Faltou coragem como no mar Vermelho, pois tanto ali quanto lá, não apareceram os corajosos, os valentes para serem os primeiros a entrarem no mar seco ou para tomarem aquelas amargas águas.

Foi muito fácil cantar depois de verem os egípcios mortos na praia ou foi ainda muito prazeroso descansar sob as sombras da palmeiras de Elim com fartura de água doce, mas o difícil foi enfrentar as duas situações anteriores.

Praticamente seriam obrigados a tomarem águas amargas, portanto não estavam errados em reclamarem, estariam sim, caso a água fosse boa para o consumo ou se tudo estivesse correndo bem, mas naquelas condições não aceitaram o que estava sendo oferecido. A visão deles contrastava com o desejo de Deus.

Teria sido esta a primeira murmuração com fundamento? Foram corretos em transparecer a insatisfação? Quem poderia questioná-los? O que mais se ouvia no meio do povo era: “Que Deus é este? O que Ele está querendo de nós? Por que nos tirou do Egito para morrermos no deserto”?

Onde encontrar água para saciar a sede de todos? De onde e como apareceria água potável? Mesmo que todas as janelas do céu fossem abertas, ou que águas brotassem[1] da terra, jamais seria suficiente. Como crer no impossível? Por isto foram impelidos ao deserto, por Deus. Naquele lugar conheceriam quem era o “Eu Sou”, o Único e verdadeiro. 

“Então chegaram a Mara; Mas não puderam beber as águas de Mara, porque eram amargas: por isso chamou o seu nome Mara. E o povo murmurou contra Moisés dizendo: Que havemos de beber?” (Ex 15.23-24). 

Bateram na porta e nada, buscaram e nada encontraram. Pediram e não receberam. Então que tipo de reação poderia vir de todos aqueles desesperados?

O fato de somente encontrarem águas amargas provocou um princípio de revolta, dando origem a mais uma murmuração, já que naquela fração de segundo se esqueceram que aquela situação era nada se comparada ao que já tinham passado.

Se esqueceram das operações no Egito ou da abertura do mar Vermelho? Para quem havia visto obras maiores e agora diante de uma situação, até certo ponto em relação às anteriores, de menores proporções, duvidar que Deus pudesse transformar aquelas águas amargas em doce, é realmente inadmissível. Somente uma palavra seria suficiente para mudar aquele caos.

Os hebreus se deparavam novamente com uma dúvida cruel, a fidelidade seguida da bênção ou a incredulidade e desaprovação por parte de Deus? Se conseguissem suportar e mostrar-se-iam fiéis, seriam livres das enfermidades[2], caso contrário sofreriam, tal como Egito sofreu.

Esta foi uma murmuração que poderíamos considerar justa, pois além da água ser de essencial importância para vida humana, teríamos que levar em conta outra questão. As águas sendo amargas não era de todo o maior problema, mas sim o fato ser a única opção e para piorar a situação, estavam sendo empurrada goela abaixo, caso quisessem viver deveriam saciar a sede com aquilo que tinham.

Os hebreus não aceitaram e murmuraram. Se era difícil se comportarem quando tudo corria bem, imaginem tendo naquela situação caótica?

continua...



[1] Como ocorreu no dilúvio, com Moisés e o capitão em Samaria (Gn 7.11, cf Nm 11.22; 2 Rs 7.2).

[2] Nunca seriam vitimados pelas mesmas enfermidades (Ex 26.26). 

Por: Ailton da Silva - 11 anos (Ide por todo mundo)

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